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Moradores de favelas protestam no Rio após megaoperação com 121 mortos

Mães que perderam filhos em outras ações policiais participaram do ato

31/10/2025 17h43
Por: Redação Fonte: Agência Brasil
© Tânia Rêgo/Agência Brasil
© Tânia Rêgo/Agência Brasil

Moradores dos complexos da Penha e do Alemão e de outras favelas do Rio de Janeiro realizam um protesto na tarde desta sexta-feira (1º), após a morte de 121 pessoas na Operação Contenção , na última terça. Mesmo debaixo de chuva, milhares de pessoas se reuniram em um campo de futebol, na Vila Cruzeiro, uma das comunidades do Complexo da Penha, de onde pretendem sair em caminhada até a Avenida Brasil, uma das principais vias expressas da cidade.

Entre os participantes, se destacam as mães de jovens mortos durante outras operações policiais. Liliane Santos Rodrigues, moradora do Complexo do Alemão, perdeu o filho Gabriel Santos Vieira, de 17 anos, há apenas seis meses. O jovem estava na garupa de uma moto por aplicativo, a caminho do trabalho, quando foi baleado com cinco tiros durante uma perseguição policial.

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“Eu estou sentindo a dor dessas mães. Foi um baque muito grande ver que um rapaz foi morto no mesmo lugar em que o meu filho morreu. Tem três dias que eu não sei o que é dormir direito. Muita gente julga, mas só sabe quem passa. Hoje eu estou aqui para dar força para essas mães.”

Até hoje, Liliane diz que tem poucas informações sobre o que aconteceu com seu filho e sobre quem fez os disparos que tiraram sua vida. Além de lutar por justiça, ela teme pela vida da filha mais nova, de apenas 9 anos.

“No dia da operação, eu estava dormindo, quando a minha filha entrou desesperada no meu quarto, tremendo, e falando 'tá dando tiro'. Quando eu vi, ela tava alisando a foto do irmão no celular e chorando. Ela me perguntou: 'Será que vai acontecer com a gente igual o que aconteceu com o meu irmão?' Foi um dia desesperador. Parecia que os tiros estavam dentro da nossa casa.”

Essa tragédia dupla se abateu sobre a família de Nádia Santos, moradora do Complexo do Chapadão. Primeiro, ela perdeu Cleyton, morto a tiros em uma ação policial em 2015, depois foi o filho mais novo, Cleyverson, alvejado em 2022.

“Esse governador é o 'Exterminador do Futuro', porque ele extermina o futuro e os sonhos dos jovens. Ele poderia entrar com educação, com saneamento básico, com emprego, mas a única oportunidade que o governo deu pra eles foi caírem no narcotráfico e pegarem um fuzil na mão. Quando o governo não dá oportunidade, o tráfico abraça.

"E não é culpa nossa. Nenhuma mãe cria seu filho pra ver ele tombado sem cabeça. Eu ainda sangro pela morte dos meus filhos, mas hoje eu tô sangrando ainda mais pelas mortes desses 121 filhos”

Quem também participa da manifestação é Adriana Santana de Araujo, mãe de Marlon Santana de Araujo, um dos 28 mortos durante uma operação no Jacarezinho, em 2021, que figurava como a mais letal do Rio antes da realizada nesta semana.

Além de perder o filho, Adriana também foi vítima de uma fake news nas redes sociais, quando a identidade de uma mulher, que aparecia em uma foto segurando um fuzil, foi falsamente atribuída a ela. O sofrimento e as consequências da mentira obrigaram a microempreendedora a se mudar do Jacarezinho, onde vivia por quase 40 anos.

“Eu vim aqui porque eu sei o que essas mães de agora estão passando. A dor não passa nunca. A gente acostuma a viver com ela. Enterram os nossos filhos mortos e enterram nós, as mães, vivas. Logo depois que o Marlon morreu, meus outros filhos me protegeram do que tava sendo falado na internet. Depois de um tempo, eu pensei em voltar a trabalhar, pra seguir com a vida. Um dia, eu fui pegar um dinheiro na casa de um cliente, mas acabei batendo na porta errada, e o cara me disse: 'se eu tivesse uma arma aqui, eu te matava, você tinha que morrer junto com o seu filho'”, lembra.

O protesto também reuniu membros de movimentos sociais e trabalhistas, como a dirigente sindical Raimunda de Jesus. “A forma que aconteceu aqui não acontece na Zona Sul, nas áreas mais ricas, mas lá também tem bandidos".

"Nós, que moramos na periferia, somos discriminados. Mas o Estado não pode nos ver como inimigos. O Estado tem que tratar e cuidar do seu povo, de toda a sua população”, afirmou.

Segundo o governo do estado, a Operação Contenção foi realizada para cumprir 100 mandados de prisão e 180 de busca e apreensão contra a facção criminosa Comando Vermelho. A mobilização de cerca de 2,5 mil agentes fez da operação a maior em 15 anos no estado, mas o número recorde de mortos a tornou a mais letal da história.

Entre as 121 pessoas que morreram, quatro eram policiais e 117 eram civis. Segundo o governo do estado, 99 já foram identificados e 89 tiveram os corpos liberados para retirada no Instituto Médico Legal . Entre os que já tiveram a identidade divulgada, 78 tinham histórico criminal, e 42 tinham mandado de prisão pendente.

Entidades de direitos humanos e organizações da sociedade civil denunciam a operação como "massacre" e "chacina" e criticam a alta letalidade da ação, que inicialmente teve o número 58 mortos divulgado pelo governo do estado.

Familiares e moradores do Complexo da Penha, entretanto, retiraram dezenas de corpos de uma área de mata na região na madrugada seguinte à ação e relatam que tambem havia sinais de tortura e até mutilações nos cadáveres.

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